Resumo
Começo com um resumo, em tópico, das ideias
principais deste artigo:
Quanto ao suporte formal, o contrato pode ser
analógico ou eletrônico (capítulo 2);
Quanto à escrita, o contrato pode ser escrito ou não
escrito (capítulo 3).
A assinatura pode ser física ou eletrônica. Esta
última pode ser simples, avançada ou qualificada. Também há assinatura
eletrônicas típicas e atípicas (capítulo 4.1 a 4.4.).
No caso de assinatura com reconhecimento de firma
(inclusive o reconhecimento de assinatura eletrônica pelo notário) ou de
assinatura eletrônica típica, o documento considera-se autêntico, de modo que
eventual impugnação do signatário quanto à sua autoria deve ser acompanhada de
prova (capítulo 4.5).
Quanto à automação, o contrato pode ser: manual ou
automatizado lato sensu (= smart contract lato sensu ou contrato autoexecutável
lato sensu). Este último é subdivido em: contrato automatizado emancipado
(smart contract stricto sensu) e contrato automatizado não emancipado (capítulo
5).
Nos contratos automatizados lato sensu, a vontade
inicial humana é a matéria-prima para a aplicação da teoria geral dos
contratos, inclusive as regras de resolução ou revisão contratual por fato
superveniente bem como as de invalidade de cláusulas contratuais. O juiz,
porém, deve manter acentuada postura de contenção em atenção ao inequívoco
interesse das partes em prestigiar uma interpretação mais literal do contrato
(capítulo 6).
1. Introdução
Este artigo foca na definição e na classificação dos
contratos eletrônicos e dos smart contracts, também chamados de contratos
inteligentes. Para tanto, o artigo aborda outras classificações, como de
assinaturas eletrônicas, tudo com o objetivo de sistematizar as terminologias.
Não se trata de diletantismo. A ciência do Direito
ocupa-se de taxonomias e classificações, porque cada categoria atrai um regime
jurídico diferente.
Registramos nossos agradecimentos ao amigo professor
Leandro da Silva Nunes Vieira, consultor legislativo do Senado Federal, dono de
um vasto conhecimento em tecnologia da informação. As conversas com ele foram
fundamentais para as reflexões deste artigo.
O presente artigo é fruto de reflexões realizadas
durante nosso estágio pós-doutoral em Direito Civil pela Universidade de São
Paulo (USP), sob a supervisão do Professor Eduardo Tomasevicius Filho.
2. Classificação do contrato quanto ao suporte
formal (analógico vs eletrônico ou digital)
Quanto ao suporte formal, o contrato pode ser
classificado em:
a) contrato analógico: é aquele resultante de um
acordo de vontades externado em um ambiente não digital.
- Incluem-se aí não apenas os contratos formalizados
por escrito em papel ou em outro suporte físico, mas também os contratos não
escritos, como os formalizados verbalmente, por gesticulações ou, até mesmo,
pelo silêncio conclusivo na hipótese do art. 111 do CC1.
b) contrato eletrônico ou digital: é aquele fruto de
acordo de vontades exteriorizado em um ambiente digital. Entende-se por
ambiente digital os canais de comunicação no meio cibernético, envolvendo
interação entre computadores, como no caso de uso da internet.
- Incluem-se aí não apenas os contratos formalizados
em arquivos de texto eletrônico (como os em formato PDF), mas também os
aperfeiçoados por e-mail, por aplicativos de conversa on-line (como o WhatsApp)
ou por outro canal de comunicação cibernético2.
3. Classificação do contrato quanto à escrita
(escrito vs não escrito)
Quanto à escrita, o contrato pode ser:
a) contrato escrito: é aquele em que o acordo de
vontades é colocado a termo, em texto escrito, ainda que em um suporte digital
(como em um arquivo eletrônico em formato PDF). Podem ser subdivididos em:
a.1) contrato por instrumento particular: é aquele
escrito pelas partes.
b.2) contrato por instrumento público: é aquele
escrito por um agente público com fé pública a partir da manifestação de
vontade das partes. É o caso dos contratos formalizados por escritura pública,
inclusive a escritura pública eletrônica lavrada por meio da plataforma do
e-Notariado (arts. 284 e seguintes do CNN-Extra-CNJ3).
b) contrato não escrito: é aquele em que o acordo de
vontades não é exteriorizado por texto escrito, a exemplo dos contratos fruto
de uma comunicação verbal (contrato verbal), ainda que por meio eletrônico
(como em videoconferência).
4. Espécies de assinatura
4.1. Introdução
No caso de contratos escritos, a prova da autoria da
manifestação de vontade costuma ser feita pela assinatura. Afinal, a assinatura
faz presumir a autoria da declaração de vontade, conforme art. 219 do CC4.
Nesse ponto, indaga-se: esse dispositivo deve ser interpretado para abranger
assinaturas físicas e eletrônicas? Responderemos após explicamos as espécies de
assinaturas.
4.2. Assinatura física e Assinatura eletrônica
A assinatura pode ser classificada em:
assinatura física: é a assinatura manuscrita, feita
a mão, em suporte físico. É a representação gráfica manuscrita feita pela
pessoa para identificar-se para fins oficiais. A assinatura física tem de ser
lançada na carteira de identidade (art. 3º, "f", da lei das carteiras
de identidade - lei 7.116/83).
assinatura eletrônica: é o ato praticado em meio
digital com o objetivo de atestar a autoria de uma manifestação de vontade.
Esse ato envolve o que chamamos de âncora de confiabilidade, assim designado o
elemento de identificação do autor da declaração de vontade5.
A âncora de confiabilidade da assinatura eletrônica
pode ser de diversos tipos, a exemplo de um código (como um login e senha)
fornecido ao sujeito por diversos meios: carta, e-mail, consulta presencial,
videoconferência etc.
Clique aqui para ler a íntegra da coluna.
________
1 Art. 111. O silêncio importa anuência, quando as
circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de
vontade expressa.
2 O anteprojeto de reforma do CC elaborado pela
comissão de juristas nomeada pelo presidente do Senado Federal em 2023 dá
didática definição: "Art. Entende-se por contrato digital todo
acordo de vontades celebrado em ambiente digital, como os contratos
eletrônicos, pactos via aplicativos, e-mail, ou qualquer outro meio tecnológico
que permita a comunicação entre as partes e a criação de direitos e deveres
entre elas, pela aceitação de proposta de negócio ou de oferta de produtos e
serviços" (Disponível aqui.)
3 Código Nacional de Normas do CNJ aplicável ao
Extrajudicial (provimento 149/23).
4 Art. 219. As declarações constantes de documentos
assinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários.
Parágrafo único. Não tendo relação direta, porém,
com as disposições principais ou com a legitimidade das partes, as declarações
enunciativas não eximem os interessados em sua veracidade do ônus de prová-las.
5 Para aprofundamento, ver: OLIVEIRA, Carlos Eduardo
Elias de; BENÍCIO, Hércules Alexandre da Costa. Assinatura eletrônica nos
contratos e em outros atos jurídicos. Disponível aqui. Publicado em 28 de
agosto de 2020.
Fonte: Migalhas